Apresentado pelo Poder Executivo à Câmara dos Deputados em 19/09/2011 o P.L. 2330/2011 visa garantir a aplicação dos compromissos assumidos pelo Estado brasileiro perante a Federation Internationale de Football Association (FIFA) para realização da Copa do Mundo de 2014 em território nacional. Entre os temas tratados pelo P.L. estão:
procedimento especial no INPI para proteção às marcas e símbolos relacionados aos Eventos;
colaboração da União com Estados, DF e municípios para que haja exclusividade da FIFA em atividades comerciais e de promoção comercial nas áreas dos Eventos;
titularidade da FIFA sobre os direitos referentes à imagens, sons e radiodifusão relacionados aos Eventos;
criação de tipos penais para condutas referentes a práticas que atentem contra a proteção das marcas e símbolos relacionados aos Eventos, inclusive o marketing de emboscada;
estabelecimento de sanções civis para outras práticas atentatórias à proteção de marcas e símbolos relacionados aos Eventos;
procedimento simplificado para concessão de vistos de entrada para estrangeiros que trabalharão ou assistirão aos Eventos;
procedimento simplificado para concessão de permissões de trabalho para estrangeiros que trabalharão nos Eventos;
estabelecimento de regras para a responsabilidade civil da União para atos referentes aos Eventos;
definição referente aos critérios para cancelamento, devolução e reembolso de ingressos para os eventos;
regulação da forma como a AGU poderá atuar nos processos em que a FIFA for parte;
definições sobre custas judiciais nos órgãos da Justiça mantidos pela União;
disponibilização pela União de serviços de segurança, saúde, vigilância sanitária, alfândega e imigração durante os eventos.
Todavia, as especificações de cada um dos tópicos supracitados (transformação em norma) tem gerado muita polêmica e campanhas de oposição, principalmente pelo medo de que seja aprovado um P.L. que fira ou regrida em relação a direitos já conquistados pelo povo brasileiro. Um primeiro tópico é a exigência por parte do órgão máximo do futebol da anulação da meia entrada para estudantes e idosos, venda casada, exclusividade no comércio de bebidas e alimentos e anulação do direito de arrependimento da compra. Estes são alguns dos pontos que desrespeitam o Código de Defesa do Consumidor (CDC) brasileiro. Para pedir a retirada deles e alteração da Lei, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) lançou a campanha “Copa sem direitos não dá jogo”, no dia 3 de outubro do ano corrente. A norma, por exemplo, dá à Fifa a possibilidade de exploração exclusiva de toda cadeia de consumo – venda, oferta, publicidade, transmissão dos jogos; dispõe sobre espaços privados, como estádios, e também sobre o espaço público – o entorno dos estádios e as principais vias de acesso.
A federação do futebol ainda terá direito de exclusividade comercial até nos espaços públicos, nas proximidades dos estádios, o que prejudica o livre comércio, direito constitucional. "O raio de quilômetros a partir dos estádios vai ser definido pelo Comitê Organizador Local, presidido por Ricardo Teixeira, e já imaginamos o abuso que vai ser”, comentou o advogado do Idec, Guilherme Varella.
Outro problema apontado é a venda casada, expressamente proibida no artigo 39 do CDC, porém permitida para a Copa do Mundo de 2014. A Fifa é quem vai determinar, de acordo com a relação do jogo, se venderá o ingresso avulso ou em um pacote.
O Código do Consumidor também garante aos brasileiros o direito de arrependimento de uma compra, no prazo máximo de sete dias, para o caso da Internet, sem multa. No entanto, com o texto atual do P.L. a Fifa poderá multar o consumidor que se arrepender da compra de um ingresso, em porcentagem que ela mesma determinará.
Problemas no campo do Direito Penal também surgiram, uma vez que a o órgão internacional impôs uma cláusula criminalizando a utilização das expressões “Copa do Mundo”, “Brasil 2014” e “Mundial de Futebol”, podendo acarretar multa e detenção de um a três meses. Para o senador Randolfo Rodrigues (PSOL-AP) “Não tem nada mais característico da celebração de uma Copa do que o povo brasileiro pintar o muro de suas ruas” e ainda classificou o projeto de lei como “uma ameaça à soberania nacional, uma lei de exceção que interfere na legislação brasileira e suprime vários artigos do Estatuto da Defesa do Torcedor e da Lei Pelé”. O parlamentar lembra que estas imposições foram feitas e negadas pelo governo alemão. Na África do Sul, porém, elas foram aceitas. Para ele, o Brasil “precisa decidir, com todo o respeito, se vai se comportar como a Alemanha ou como a África do Sul”. Randolfo ainda segue na oposição à Lei Geral da Copa : “Estas normas estão sendo impostas por uma entidade suspeita, acusada de corrupção. A Lei Geral da Copa é uma ameaça à soberania nacional, fere a responsabilidade civil da União. A Copa do Mundo não está acima da Constituição brasileira”.
A entidade também já chegou a ameaçar o Brasil de perder o direito a ser sede do mundial devido a atrasos em obras e demora na aprovação da referida lei. O novo ministro dos esportes, Aldo Rebelo afirmou em entrevista no dia 13 de novembro deste ano que “não estamos atrasados, porque creio que este ano a Câmara irá votar e no começo do ano o Senado votará na Lei Geral”. O ministro acredita que o maior problema é cumprir todo o cronograma criado para a Copa do Mundo de 2014. “Os nossos desafios mais importantes não estão no Legislativo. Nosso desafio é cumprir o cronograma e preparar a infraestrutura. A parte esportiva vai muito bem: os estádios, a questão aeroportuária, mobilidade, segurança, acho que está muito bem encaminhado”. Já em sua coluna no site oficial da Fifa, Jérôme Valcke, secretário geral da Fifa, afirma que a crise com o governo brasileiro, que vinha desencadeando em uma série de desentendimentos, foi encerrada. "A recente conversa que tive com a presidente Dilma Rousseff, o novo ministro do Esporte, Aldo Rebelo, e o deputado Vicente Cândido (relator da Lei Geral da Copa) me deixou convencido de que chegamos a um entendimento comum sobre aquilo que é necessário para fazer da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo de 2014 um sucesso absoluto".
Pois bem, se dependermos de Aldo Rebelo e de Jérôme Valcke seremos sucesso absoluto de entrega e submissão da nação a um órgão internacional interessado apenas nos próprios lucros e de seus patrocinadores e promoção da própria imagem. Analisando a situação, fica muito clara a prepotência do órgão em se colocar como superior ao Brasil, se atribuindo o direito de interferir na legislação de país alheio como bem lhe entender. Qual é a ideia que é passada com a conformidade da Fifa em aceitar a negação de suas exigências por um país, considerado potência e de sua explícita vontade em se impôr sobre um país considerado até então de menor expressão?
Não é possível que se permita uma “lei de exceção” como classificou o senador do PSOL-AP para um evento como a Copa do Mundo. Aliás, para nenhum evento. Ferir a soberania nacional, os códigos civil, de defesa do consumidor e penal e a própria Constituição é uma afronta, uma petulância e uma demonstração de desprezo de proporções inimagináveis. Aprovar essa lei, com o atual texto é dar sinal verde para que órgãos como a Fifa adentrem território nacional, usufruam e suguem tudo o que julgarem necessário, da forma como quiserem. O Brasil também deve lucrar com a Copa. O povo brasileiro deve ser amplamente beneficiado, assim como a própria Fifa, organizadora do evento, é claro. Mas beneficiar uma parte em detrimento de outra por mero capricho fere qualquer conceito de justiça vigente. E mais: aprovar esse P.L. é concordar com a prática da injustiça e abrir precedentes para a atuação de mais órgãos e mais empresas mal intencionadas em nossas terras.
Resta então, a dúvida: enquanto governo e Fifa discutem o P.L. e a Grande Mídia nada veicula sobre fatos tão relevantes para a vida e o sentimento nacional, por onde anda o povo? O povo anda alienado e calado, do jeito que eles lá em cima gostam.